Um professor, um livro


Quando um homem constrói uma casa a começar pelo telhado, tudo pode acontecer, até escrever um conto a partir de um título.


O Livro da minha vida:

Alguns livros são como auto-estradas. Avançamos rapidamente, sem fruir a paisagem, em busca do fim da viagem. Outros serpenteiam por encostas belíssimas: paramos, fotografamos e a sua riqueza ilumina-nos durante anos. Outros livros são ainda penosos carreiros que calcorreamos procurando-lhes sentidos. Percursos mais ou menos difíceis, surpreendem-nos muitas vezes pela positiva. Escolher um livro ou O LIVRO que nos tenha marcado e proporcionado um novo mundo, uma nova visão da realidade é uma tarefa ardilosa. Mas de entre os consagrados clássicos como a Cidade de Deus e Confissões de St Agostinho, Esteiros de Soeiro Pereira Gomes e O Evangelho Segundo Jesus Cristo de Saramago, escolhi um livro – O Homem da Máquina de Escrever de Fernando de Campos. É quase considerado um livro de bolso que se lê “en passant”. É um livro onde o autor se revela um verdadeiro demiurgo, pois assume em simultâneo a pele de autor, narrador, narratário, protagonista e leitor. A forma como o autor nos agarra pela mão e nos conduz a um enredo brilhante de um homem que compra um objeto – uma máquina de escrever – transporta-nos para a partir daí uma catadupa de acontecimentos que emerge o leitor como parte da estória.  A imaginação do autor é frenética deixando-nos atordoados pelo non sense, pela sátira insidiosa e pelos dilemas que subliminarmente coloca acerca do mundo poético e da literatura. Percebemos que para o escritor o êxito da escrita reside na felicidade de expressão verbal, que de qualquer modo poderá realizar-se por meio de uma inspiração imprevista, mas que normalmente quer dizer uma paciente procura do «mot just» da frase em que a palavra é insubstituível do encontro de sons e de conceitos mais eficaz e denso de significado – a procura de uma expressão necessária, única, densa, concisa, memorável. É este dilema o'nelliano que perpassa ao longo da estória – ceder à inspiração ou dedicar-se ao suor? O leitor que vai seguindo “par i passu” o desfilar de construção de uma estória percebe que afinal tudo é possível, pois como refere o autor “Quando um Homem constrói uma casa a começar pelo telhado, tudo pode acontecer, até escrever um conto a partir de um título”.
Imperdível!

Pedro Campos

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